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DISCURSO ÀS NORMALISTAS DE 1962

 

Fui escolhido novamente por vós, bondosas normalistas de 62, com a honrosíssima incumbência de pronunciar a alocução final, para dar o adeus da Escola e apresentar-vos os votos de felicidade no trabalho difícil, altruísta, mas ao mesmo tempo tão abençoado que em breve ireis iniciar.

Antes da palestra propriamente dita, desejo apresentar às alunas o meu afetuoso boa noite, cheio de felicitações por este momento até agora tão almejado e que daqui para o futuro se tornará repleto de reminiscências; aos visitantes e familiares as alegres e efusivas boas vindas deste Instituto e à Mesa, que preside os trabalhos, a benevolência de me ouvir, após haver escutado a palavra gentil e esmerada da distinta oradora.

Distintas normalistas finalistas, e eu acrescentaria a esta rima que vos é familiar mais adjetivos e substantivos que vos identificam – altruístas, idealistas, e algumas pianistas, outras coristas, há uma até piadista, outra poderá ser fadista, porém, todas otimistas e a nós benquistas, mas não quero aumentar mais a lista.

Amáveis diplomandas, durante três anos estudamos juntos, constituindo uma espécie de família sem discórdias, pois notávamos que a nossa amizade crescia, a medida que os anos se passavam e cremos ser esta amizade, que vos levou a me escolherdes para ser o vosso paraninfo.

As palavras, como as folhas, são levadas pelo vento e em breve ninguém se lembrará nem de uma sequer das que estamos pronunciando neste momento, talvez tenha sido esta a razão de me solicitardes o discurso por escrito e, prazerosamente, aquiesci ao pedido e o farei no final destas simples, mas sinceras palavras.

Distintas concluintes do normal, ides em breve enfrentar uma sociedade com problemas, os mais intrincados e difíceis, creio, porém, que os quatro principais da nossa Pátria são estes: o problema econômico; o problema de cultura, ou melhor da falta de cultura; o problema ético e o problema religioso, ou de uma falsa religiosidade.

O problema econômico está levando o Brasil ao caos, como reconhecem os próprios responsáveis pelas finanças nacionais, e este descalabro econômico nós o sentimos bem de perto, nas aperturas financeiras de cada dia e quase já estamos descrentes na capacidade das autoridades para solucioná-lo satisfatoriamente. (Note bem, estas palavras foram pronunciadas no tumultuado governo de João Goulart).

Se as atividades econômicas são úteis e necessárias e devem ser resolvidas para a grandeza material, muito mais o serão as educativas, as éticas e as religiosas, porque as educativas preparam a grandeza mental de um povo e as éticas ou dos costumes se entrelaçam com as religiosas e fazem a grandeza moral e espiritual de uma nação; por assegurarem os ensinos religiosos, os princípios de honestidade, os deveres de firmeza à verdade. Enfim a ética tem que ver com todas as nossas relações na sociedade e a questão religiosa com a nossa relação para com Deus.

Se quase nada podereis fazer na solução do problema econômico, certo estou de que para equacionar os outros, em vossa esfera de ação, estais preparadas e por isso vos conclamamos para esta árdua, mas abençoada tarefa.

O trabalho não é fácil bem o sabemos, mas o Senhor nos impôs a responsabilidade de sermos o sal da terra e a luz do mundo, querendo com esta expressão indicar, que pela nossa profissão e vida devemos contribuir para o bem da humanidade.

Para esta tão magna empresa sentimos a nossa pequenez e nos lembramos de dois versos do poeta máximo da língua portuguesa – Camões – que nos Lusíadas escreveu (Canto 11, estância 31).

“Ó Tu, guarda divina, tem cuidado

De quem sem ti não pode ser guardado”.

 

Este dístico é uma síntese de sugestiva oração e, parafraseando o poeta, poderíamos respeitosamente dizer: o Senhor, guarda estas normalistas, ajuda-as em seu trabalho e abençoa-as na excelsa e nobilitante missão de ensinar.

Em vosso trabalho encontrareis incompreensões de toda a espécie, problemas e dificuldades, que vos poderão levar ao desânimo, porque estes por vezes parecem insuperáveis, mas sereis triunfantes se tiverdes ao Senhor ao vosso lado, como guia e ajudador.

Deveis ter nele a confiança que tinha o salmista Davi, quando no Salmo 18:29 exclamou: “Contigo entrarei pelo meio de um esquadrão, com o meu Deus transporei muralhas”.

Com Cristo não há problemas insolúveis.

A acatada educadora Ellen G. White aconselhando a professores afirmou que podemos ensinar pelo exemplo e pela palavra, mas concluiu que o ensino pelo exemplo é muito mais eficiente.

Perguntareis vós. Como poderemos ensinar pelo exemplo? Quais os requisitos exigidos de nós, como mestres cristãos, para ensinarmos não pelo preceito, mas pela vida.

Entre os inúmeros requisitos, na página 277, do livro Educação, encontramos estes:

“Ordem, perfeição, pontualidade, governo de si mesmo, temperamento jovial, uniformidade de disposição, sacrifício próprio, integridade e cortesia”.

No mesmo livro e na mesma página já mencionada há outro pensamento que por merecer a atenção e o interesse de todos os que se dedicam ao ensino queremos destacar:

“O professor não poderá impor-se ao respeito de seus discípulos de nenhuma outra maneira a não ser revelando em seu próprio caráter os princípios que ele procura ensinar-lhes”.

Sem sair desta seqüência de idéias desejo lembrar-vos que o Livro Santo, na Primeira Epístola aos Coríntios 4:20 diz: “que o reino de Deus não consiste em palavras, mas em virtude”, querendo com esta frase ensinar-nos o preceito divino que é na vida e não na boca, nos atos e não nas palavras que está o verdadeiro valor.

Há uma falsa religiosidade em nossa Pátria, porque há muita religião nos lábios, muita religião pregada, mas pouca religião vivida.

Se deixarmos a história sagrada e perlustrarmos a história secular, concluiremos que os princípios apresentados pelos grandes pensadores são os mesmos, pois o famoso filósofo latino Sêneca preceituou:

“Quando nos guiam por preceitos o caminho é longo, o exemplo abrevia-o e fortifica-nos”.

Guiai as crianças não tanto por doutrinas e regras, mas pelo vosso exemplo, para que o caminho e o estudo lhes sejam fáceis e agradáveis.

Gentis professoras, esforçai-vos sempre para aumentar o vosso conhecimento, pois não podereis perder de vista o fato, de que até o último dia da vida sereis estudantes. Deveis ainda estar bem cientes desta verdade, que na escola apenas aprendestes a estudar, recebestes uma orientação geral, porém o verdadeiro estudo começa ao deixar os bancos escolares; mas aumentando em saber devemos também aumentar em simplicidade e humildade.

Quero lembrar-vos de um dos conselhos do respeitável mestre Rui Barbosa, que paraninfando uma turma de ginasianos disse:

“Para não arrefecerdes imaginai que podeis vir a saber tudo, para não presumirdes, refleti que, por muito que souberdes, mui pouco tereis chegado a saber”.

Procurai ser sempre humildes, porque a humildade é entre as virtudes uma das mais belas, uma das mais agradáveis e porque não dizer mesmo, a mais cristã.

“Nada é tão ofensivo a Deus, nem tão prejudicial à alma humana como o orgulho e a presunção”. – Parábolas de Jesus, pág. 154.

Desejo ainda falar sucintamente sobre um aspecto do ensino, que alguns poderão achar fora de lugar num discurso de formatura, mas a mim não me parece ao falar a normalistas, e este aspecto é o das notas. Como professoras encontrareis este problema e penso com alguns, que se não houvesse notas a nossa missão seria mais fácil, porém, a nota apenas se tornaria supérflua se todos os alunos estudassem para aprender e não somente para passar de ano e alcançar um diploma.

Em ligeira consideração, posso dizer que ao atribuirmos as notas, há dois extremos que devemos evitar. O primeiro é o

da nota excessivamente baixa, que mata a confiança própria, desanima o educando a prosseguir, podendo até trazer-lhe complexos de inferioridade; e o segundo que precisamos evitar é o caso contrário, da nota alta, liberal, que pode mesmo depor contra a capacidade e idoneidade do mestre. Esta nota generosa, quase sempre, é prejudicial porque o estudante raciocina da seguinte maneira, se tiro nota alta sem estudar, não preciso esforçar-me. Estes dois erros opostos devem ser evitados, porque a nota muito baixa pode fazer um vencido e a muito alta um convencido.

Não posso concluir sem dizer uma palavra sobre o lema escolhido.

“Educação – Seguro para a Vida, Passaporte para a Eternidade”.

Ele é sugestivo, profundo, inspirador e demonstra ainda que como mestras cristãs estais preocupadas não apenas com a preparação do educando para esta vida, mas especialmente para a vida do porvir.

Distintas normalistas, quero ainda dizer-vos que de nada valerá um lema se não envidardes esforços para que ele se concretize em esplêndida realidade.

Prezadas formandas, ou melhor já agora formadas, procurai nortear a vossa vida profissional inspiradas no sublime ideal da educação cristã e se a vossa profissão não trouxer compensações materiais, podereis estar cientes de que nela haverá compensações morais e espirituais.

Ao nos despedirmos, distintas amigas, quero deixar convosco ainda dois pensamentos de uma notável e dedicada professora:

1º) “Um mestre zeloso aproveita todos os meios para fazer bem aos seus discípulos”.

2º) “Amar a vossa profissão, de alma, vida e coração e aplicar-vos a desempenhá-la com todo o zelo e perfeição possíveis”.

 

Do Todo-Poderoso nos vem todas as coisas, portanto a Ele o nosso mais sincero, o mais expressivo e o mais justo dos agradecimentos.

Amém.

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